Para a exposição Da Tradição, Ranços e Coisas da Origem
Sobre a má pintura - Leitura de texto de Umberto Eco
Sobre a má pintura - Leitura de texto de Umberto Eco
A ânsia
de desenvolver uma produção de cunho literário em desenho e
pintura, considerando a consciência do valor que cabe a este tipo de
trabalho na contemporaneidade me traz a rediscutir formas
tradicionais das expressões plásticas bidimensionais. Para tanto,
tratarei em algumas postagens sobre alguns discursos críticos sobre
pintura, que estabeleceram critérios avaliativos e classificatórios
de propostas realizadas nesta forma de expressão. Deixo claro que
não é meu desejo criar um discurso de apologia às formas
tradicionais das artes visuais, muito menos apoiar o retorno às
ditas belas artes, porém tenho como relevância aqui tratar a
pintura como suporte hoje, um lócus ainda passível de composição
e apresentação de um discurso, ignorando a amplitude de sua
recepção.
Em
primeira instância, como postura crítica sobre a pintura, abordo
sobre os argumentos apresentados por Umberto Eco em ensaios que têm
pinturas como objeto de análise. A escolha dos textos do autor se dá
pelo seu ângulo de análise (temporal e interpretativo), que
possibilita uma fusão (ás vezes até paradoxal) de valores
tradicionais, modernos e contemporâneos. Eco também é relevante
por ainda dar crédito à pintura como suporte da arte e, devido a
sua ação crítica, estabelece valores que qualificam estas obras
como boas e ruins. Conforme Eco (1986,p.70) “para dizer que um
pintor é ruim é preciso ter uma ideia de Arte” e para tanto
apresenta o grupo que é considerado como arte:
Nós estamos habituados a achar
que obras de arte são objetos que a) por um lado nos obrigam a
considerar o modo como foram feitos e b)por outro, nos deixam
inquietos, porque não é assim tão pacífico que queiram dizer o
que aparentemente parecem dizer. Neste sentido a “ambiguidade”
não é necessariamente reduzível à deformação, à inovação
estilística, ao rompimento das expectativas; pode também ser isto
(e frequentemente na arte contemporânea o é ou o era), mas
sobretudo quer dizer um “sentido a mais” ou “polissemia”, se
quisermos (ou queremos dizer abertura?). A obra está ali - quadro,
poesia, romance- parece contar-nos que existe em algum lugar uma
mulher, uma flor, uma colina da qual se vêem outras colinas, um
poeta que ama uma criatura angelical, e ainda assim percebemos que
não nos diz somente aquilo, mas sugere uma coisa a mais(às vezes o
contrário do que parece dizer). (ECO,1986,p.70)
A afirmação de Eco, presente em uma crítica à obra
do artista italiano Francesco Háyez (1791-1882)
intitulada “Sobre a má pintura”, especifica no seu primeiro
crivo o interesse pela técnica, pelo fazer a partir da habilidade
manual do artista. Reforça este discurso afirmando que até uma obra
abstrata, quando produzida de forma minuciosa indica que há
possibilidade de leituras que extrapolam a mera representação da
coisa na obra. Eco cria assim uma relação de dependência
intrínseca entre o critério (a) e (b), colocando a minucia técnica
como parâmetro de mérito para a interpretação da obra.
Maria Madalena Penitente, Francesco Háyez, 1825 - Galeria Cívica de Arte Moderna, Milão, Itália.
Sobre Háyez, Eco trata a sua obra como ruim
por ser objetiva em sua representação, ou seja, não explora um
jogo simbólico que possibilitaria leituras ampliadas das
representações. Conforme Eco, a obra de Háyez padece no sentido de
apenas propiciar a leitura do que representa. De outra forma, Eco
também questiona o trabalho de Háyez em seus princípios técnicos:
“A obra de Háyez é malfeita porque me faz lembrar o modo como eu
… procuro desenhar(ECO,1986,p.71)
, a reforçar assim, os contrastes entre o desenho, a pintura e a
ilustração e a dispor uma hierarquização destas formas.
Porém, a relevância dos padrões simbólicos
e de sempre haver a possibilidade de uma leitura ampliada das obras
alcançam um espaço maior nas propostas de Eco, com abordagens que
variam desde os discursos sobre alegoria até análises semióticas.
Em breve, continuaremos essas discussões em novas postagens.
Para uma melhor leitura:
e
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