quinta-feira, 8 de novembro de 2012


Para a exposição Da Tradição, Ranços e Coisas da Origem

Sobre a má pintura - Leitura de texto de Umberto Eco

A ânsia de desenvolver uma produção de cunho literário em desenho e pintura, considerando a consciência do valor que cabe a este tipo de trabalho na contemporaneidade me traz a rediscutir formas tradicionais das expressões plásticas bidimensionais. Para tanto, tratarei em algumas postagens sobre alguns discursos críticos sobre pintura, que estabeleceram critérios avaliativos e classificatórios de propostas realizadas nesta forma de expressão. Deixo claro que não é meu desejo criar um discurso de apologia às formas tradicionais das artes visuais, muito menos apoiar o retorno às ditas belas artes, porém tenho como relevância aqui tratar a pintura como suporte hoje, um lócus ainda passível de composição e apresentação de um discurso, ignorando a amplitude de sua recepção.

Em primeira instância, como postura crítica sobre a pintura, abordo sobre os argumentos apresentados por Umberto Eco em ensaios que têm pinturas como objeto de análise. A escolha dos textos do autor se dá pelo seu ângulo de análise (temporal e interpretativo), que possibilita uma fusão (ás vezes até paradoxal) de valores tradicionais, modernos e contemporâneos. Eco também é relevante por ainda dar crédito à pintura como suporte da arte e, devido a sua ação crítica, estabelece valores que qualificam estas obras como boas e ruins. Conforme Eco (1986,p.70) “para dizer que um pintor é ruim é preciso ter uma ideia de Arte” e para tanto apresenta o grupo que é considerado como arte:

Nós estamos habituados a achar que obras de arte são objetos que a) por um lado nos obrigam a considerar o modo como foram feitos e b)por outro, nos deixam inquietos, porque não é assim tão pacífico que queiram dizer o que aparentemente parecem dizer. Neste sentido a “ambiguidade” não é necessariamente reduzível à deformação, à inovação estilística, ao rompimento das expectativas; pode também ser isto (e frequentemente na arte contemporânea o é ou o era), mas sobretudo quer dizer um “sentido a mais” ou “polissemia”, se quisermos (ou queremos dizer abertura?). A obra está ali - quadro, poesia, romance- parece contar-nos que existe em algum lugar uma mulher, uma flor, uma colina da qual se vêem outras colinas, um poeta que ama uma criatura angelical, e ainda assim percebemos que não nos diz somente aquilo, mas sugere uma coisa a mais(às vezes o contrário do que parece dizer). (ECO,1986,p.70)


A afirmação de Eco, presente em uma crítica à obra do artista italiano Francesco Háyez (1791-1882) intitulada “Sobre a má pintura”, especifica no seu primeiro crivo o interesse pela técnica, pelo fazer a partir da habilidade manual do artista. Reforça este discurso afirmando que até uma obra abstrata, quando produzida de forma minuciosa  indica que há possibilidade de leituras que extrapolam a mera representação da coisa na obra. Eco cria assim uma relação de dependência intrínseca entre o critério (a) e (b), colocando a minucia técnica como parâmetro de mérito para a interpretação da obra.

                                               Maria Madalena Penitente, Francesco Háyez, 1825 - Galeria Cívica de Arte Moderna, Milão, Itália.



Sobre Háyez, Eco trata a sua obra como ruim por ser objetiva em sua representação, ou seja, não explora um jogo simbólico que possibilitaria leituras ampliadas das representações. Conforme Eco, a obra de Háyez padece no sentido de apenas propiciar a leitura do que representa. De outra forma, Eco também questiona o trabalho de Háyez em seus princípios técnicos: “A obra de Háyez é malfeita porque me faz lembrar o modo como eu … procuro desenhar(ECO,1986,p.71) , a reforçar assim, os contrastes entre o desenho, a pintura e a ilustração e a dispor uma hierarquização destas formas.  

Porém, a relevância dos padrões simbólicos e de sempre haver a possibilidade de uma leitura ampliada das obras alcançam um espaço maior nas propostas de Eco, com abordagens que variam desde os discursos sobre alegoria até análises semióticas. Em breve, continuaremos essas discussões em novas postagens. 


Para uma melhor leitura:




e













Nenhum comentário:

Postar um comentário